Exportação de autopeças para blocos regionais é saída para manter setor

São Paulo – Frente ao período de transição global para a eletrificação é uníssona a avaliação de que o caminho a ser trilhado por Brasil e Argentina será o de veículos híbridos, além dos tradicionais dotados de motores a combustão, que deverão ter vida longa, uma vez que a participação dos movidos a bateria no mundo é de 1,8% e que o período mínimo para a renovação da frota global, de 1,4 bilhão de unidades, supondo que todos os novos veículos fossem elétricos, seria de 17,6 anos. Dentro da realidade factível e esperada, de que 30% sejam a bateria, serão necessários 58,8 anos. Dito isto a exportação de autopeças para blocos regionais é projeto que deve ser intensificado a fim de que sejam atraídos olhares, demanda e investimentos.

Foi o que avaliaram os presidentes da Afac, Associação de Fábricas Argentinas de Componentes, Norberto Taranto, e do Sindipeças, Cláudio Sahad, durante o primeiro dia do 5º Congresso Latino-americano de Negócios do Setor Automotivo, realizado pela AutoData de forma online até a sexta-feira, 15.

Sahad apontou que de 2019 a 2022 os blocos regionais representaram 90% das exportações de autopeças. Destaque para a América do Sul, que consumiu metade do volume no ano passado, que rendeu US$ 4,1 bilhões – enquanto três anos atrás a fatia era de 34,2% e quem liderava as encomendas eram Estados Unidos, Canadá e México, com 36,8%. No ano passado o USMCA, antigo NAFTA, comprou 26% do total ou US$ 2,1 bilhões.

Neste período a União Europeia recuou de 16,6% para 13,6%, ou US$ 1,1 bilhão, os Brics também, de 3,2% para 2,8%, ou US$ 231 milhões, e demais países da América Latina, exceto o México, de 1,6% para 0,8%, ou US$ 69 milhões.

“O potencial é enorme e, para impulsioná-lo, é preciso estabelecer, imediatamente, o acordo com a União Europeia, a fim de expandir as exportações, incluir o setor automotivo no acordo do Mercosul e, claro, melhorar as condições internas de competitividade para reduzir o custo de produção. E assim fazer com que as multinacionais concentrem suas produções de motores aqui à medida que os países europeus e os Estados Unidos forem avançando à eletrificação até 2035.”

Outro dado apresentado pelo dirigente do Sindipeças foi que neste mesmo período, de 2019 a 2022, 11,6% das exportações totais de autopeças foram de motores e 26,4% de componentes para motores. Neste ano até junho os motores representaram 11% e seus componentes 22,8%.

“Com este potencial e diante do fato de que até 2050 só deverão restar três mercados com fabricação de motores a combustão, Brasil, Índia e China, sendo que os chineses deverão concentrar esforços nos elétricos, isto pode trazer receita que permita que as fabricantes invistam em tecnologia e inovação e assegurem sua sobrevivência.”

Taranto apontou que Brasil e Argentina complementam suas produções, uma vez que o país vizinho tem vocação para picapes e também tem a intenção de intensificar sua fabricação – atualmente apenas 55% da capacidade instalada de 1 milhão de unidades atuais é utilizada: “O futuro para a nossa região será híbrido, não há dúvidas. Se no mundo 1,8% da frota é elétrica na Argentina o porcentual é de 0,15%”.

Ele chamou a atenção, também, para o fato de que a fatia de mercado dos eletrificados no mundo avançou de 0,2% em 2013, com 206 mil unidades, para 13%, com 10,5 milhões, em 2022, crescimento que deve ser mantido na casa de 50% por ano.

O dirigente da Afac lembrou a participação dos dois países na produção mundial de veículos. Ambos mantiveram seus porcentuais, Brasil com 2,8% e Argentina com 0,6% ao longo de duas décadas, apesar de a quantidade fabricada ter saltado de 1,6 milhão para 2,3 milhões de veículos, no caso brasileiro, e de 340 mil para 537 mil no caso argentino.

Embora houvesse picos, como em 2010, quando Brasil alcançou 4,3% de representatividade devido a 3,3 milhões de unidades anuais e a Argentina com 0,9%, 717 mil unidades, a China saltou de 4% para 32% de 2000 a 2022, de 2 milhões para 27 milhões de veículos por ano.

“Precisamos ser mais competitivos para absorver a produção de países que deixarão de fabricar veículos e componentes a combustão e impulsionar a nossa, pois o motor a combustão terá vida longa tanto em OEM como na reposição.”

Produto brasileiro perde espaço na América Latina

São Paulo – Os veículos produzidos no Brasil estão perdendo espaço nos países vizinhos onde, pela distância, deveriam ser opções naturais. Como mostrado em estudo feito pela Anfavea no ano passado os modelos produzidos na China representaram 21,2% das importações dos países latino-americanos, enquanto os brasileiros ficaram com fatia de 19,4%. Há dez anos a porcentagem era 4,6% e 22,5%, respectivamente.

“Países da Ásia aumentaram, nos últimos anos, sua produção visando à exportação. Enquanto isso o Brasil andou de lado, perdeu competitividade e passou a perder espaço em sua própria região”, disse Márcio de Lima Leite, presidente da Anfavea, em sua palestra no 5º Congresso Latino-americano de Negócios do Setor Automotivo, organizado pela AutoData. “Este ano o mercado global de veículos cresce em torno de 7%. No Brasil e na Argentina as vendas ficarão em torno de 1,3% maiores.”

A solução para crescer a produção nestes dois países, portanto, é ganhar espaço nos mercados vizinhos. Mas, como mostrado por Lima Leite, o que vem ocorrendo é justamente o contrário.

Para o presidente da Anfavea o preço é questão importante. No Brasil, segundo ele, o custo aumenta de forma estrutural. A reforma tributária, que tramita no Congresso, ajudaria a eliminar parte das distorções: “A premissa desta reforma tributária é tributar o consumo. Hoje o Brasil exporta impostos que incidem sobre a folha de pagamento, por exemplo”.

Ganhar espaço na América Latina, e em outros mercados-alvo como a África, ajudaria ao Brasil a ter maior escala que, junto com correções de tributos, poderia elevar a competitividade do produto nacional. Hoje a batalha é dura: “Destas importações que citamos muitas são feitas por matrizes de montadoras já instaladas aqui. Em alguns casos é mais vantajoso importar de outros locais do que do Brasil ou da Argentina”.

América Latina apresenta cenários opostos em 2023

São Paulo – Depois de dois anos muito bons para quase todos os mercados automotivos da América Latina, com os principais registrando crescimento das vendas, 2023 tem apresentado cenário diferente segundo Martin Bresciani, presidente da Aladda, Associação Latino-americana dos Distribuidores de Veículos Automotores. Ele participou do primeiro dia do 5º Congresso Latino-americano de Negócios do Setor Automotivo, realizado pela AutoData até a sexta-feira, 15.

Até julho os mercados registraram movimentos bem diferentes: “Temos muitas luzes e sombras na região, com Argentina, México, Peru e Equador crescendo e indicando projeções de alta para 2023, enquanto no Brasil a expectativa é de um resultado parecido com o do ano passado. Chile e Colômbia possuem projeções negativas para o ano, após um primeiro semestre de queda nas vendas”.

Para ele o Chile é o país da região com o maior número de problemas para conseguir recuperar suas vendas, que deverão encerrar o ano com queda de 30% caso o mercado local não consiga reverter parte da retração acumulada. A maioria das marcas, hoje, está perdendo dinheiro ou faturando apenas o suficiente para pagar seus custos, cenário que preocupa e demanda muito trabalho para que as previsões para 2024 sejam um pouco melhores.

O mercado automotivo chileno está sofrendo com falta de crédito para financiamentos, que representam 50% das vendas anuais, e as altas taxas de juros praticadas. Problemas políticos também afetam os negócios. “Os políticos estão mais preocupados em suas disputas pessoais do que com projetos econômicos para recuperação do país”.

Com relação ao futuro dos negócios na região o presidente entende que os concessionários precisam investir na digitalização de seus negócios, para chegar até os clientes: “Hoje o consumidor quer ter tudo na mão, por meio do seu smartphone, e quem não conseguir atender a essa demanda do cliente, com informações rápidas e completas, ficará de fora”. 

A presença cada vez maior dos veículos chineses na região também é uma realidade, com as marcas avançando em mercados nos quais ainda não estavam tão presentes, caso do Brasil, onde algumas empresas estão até instalando fábricas para produzir híbridos e elétricos. É neste segmento que as marcas chinesas e asiáticas deverão conquistar a maior parte de seus clientes na região, tornando-se os principais fornecedores de eletromobilidade impulsionados pelos preços competitivos.

Toyota testa sistema híbrido flex plug-in no Brasil

São Paulo – A Toyota anunciou que iniciou os testes internos do sistema híbrido flex com tecnologia plug-in. Os estudos, no primeiro estágio, se mostraram “promissores”, segundo informou a companhia, que pretende incluir nos próximos ciclos de investimento uma futura produção nacional de PHEV-FFC, sigla em inglês para veículos híbridos plug-in flex fuel.

O veículo está sendo avaliado no laboratório da Toyota do Brasil, com base em um sistema híbrido similar ao aplicado nos Corolla e Corolla Cross, vendidos no mercado nacional, aliados a uma bateria de alta capacidade e um motor elétrico de maior potência.

“Partindo do princípio de que o híbrido flex possui um dos mais altos potenciais de compensação e reabsorção na emissão de CO2 gerado desde o início do ciclo de uso do etanol extraído da cana-de-açúcar, passando pela disponibilidade nas bombas de abastecimento e sua queima no processo de combustão do carro, estamos animados com os testes em um híbrido plug-in”, disse Rafael Chang, presidente da Toyota do Brasil. “O híbrido plug-in flex combina o melhor de dois mundos: elétrico com zero emissões para viagens urbanas diárias e combustão com baixas emissões para longas distâncias.”

Outro ponto mostrado pelo presidente é o adensamento da cadeia produtiva, localizando a produção de componentes do sistema: “Ao fortalecermos a produção local de componentes estamos não apenas impulsionando a inovação e a qualidade mas, também, contribuindo para a sustentabilidade, o crescimento e a autonomia da indústria automotiva brasileira”.

ZF produz 1 milhão de transmissões TraXon para pesados

São Paulo – Lançada pela ZF em 2014 a transmissão TraXon, dedicada a veículos comerciais pesados, contabilizou sua milionésima unidade. O marco foi alcançado na fábrica de Friedrichshafen, Alemanha. O componente é produzido, também, em Jiaxing, China, e em Sorocaba, SP.

Frente a esses resultados a ZF está se preparando para produzir sua sucessora, a TraXon 2, que entrará em produção em 2024. A transmissão incorporará avanços como a ECU, unidade de controle eletrônico, e os atuadores desenvolvidos internamente pela companhia, ao mesmo tempo em que aproveita recursos de software AMT.

FPT Industrial apresenta motor dual-flex para aplicação agrícola

São Paulo – Durante o 20º Fórum SAE Brasil da Mobilidade, realizado em Curitiba, PR, em 12 e 13 de setembro, a FPT Industrial apresentará seu motor conceito N67 Dual-Fuel desenvolvido em parceria com a Unifei, Universidade Federal de Itajubá, para aplicação agrícola.

O equipamento na configuração fora de estrada para tratores utiliza biocombustíveis associados ao diesel, como etanol, gás natural, diesel de cana-de-açúcar, hidrogênio, biogás e HVO. O objetivo é, além de reduzir as emissões, elevar a eficiência do veículo.

A parceria da FPT Industrial colabora com a pesquisa e a inovação da Unifei como parte do Programa Rota 2030. Segundo o coordenador geral do projeto, Christian Coronado, esta relação também acelera o desenvolvimento acadêmico. Em breve a sede da Unifei, em Itajubá, MG, receberá um centro de produção de hidrogênio verde.

Volkswagen anuncia retorno do Tïguan Allspace

São Paulo – A Volkswagen anunciou a volta do SUV Tiguan Allspace ao mercado brasileiro ainda este ano, com novo design e novos itens de conforto e segurança. O Tiguan foi um dos primeiros SUVs vendidos pela companhia no País: desde 2009 registra mais de 60 mil emplacamentos.

A versão Allspace, com a terceira fileira de bancos e capacidade para transportar até sete pessoas, foi lançada em 2018, importada do México. Em 2021 sua importação foi suspensa e agora será retomada, já com visual reestilizado.

Ele expande a linha de SUVs Volkswagen composta por Nivus, T-Cross, Taos e o elétrico ID.4.

Ford lança novas versões da Ranger de olho nos frotistas

Tatuí, SP – Pouco tempo após lançar a nova geração da Ranger a Ford amplia o portfólio da picape, agora focando os frotistas, nas operações de trabalho e de uso misto. As versões responsáveis para atender a estas demandas são a XL e a XLS, a segunda com três configurações, uma com tração 4×2, outra com tração 4×4 e uma com tração integral 4×4 e motor V6, novidade importante para o público que gosta de mais desempenho sem tantos equipamentos como nas versões mais caras.

Com as duas novas versões a Ford também mira alguns nichos de mercado, caso da Polícia, que realiza algumas modificações no veículo e usa em suas operações, e mineradoras. A versão XL foi desenvolvida para atender aos frotistas e aos clientes que usam o veículo exclusivamente para trabalhar. Esta versão tem o preço de R$ 240 mil, equipada com motor diesel 2.0 de 170 cv de potência, já homologado para rodar com B20, câmbio manual de cinco marchas e tração 4×4.

Para atrair os clientes interessados a Ford aposta no preço, menor que o de seus concorrentes, como Toyota Hilux e Chevrolet S10. A lista de itens de série, bem maior do que a da concorrência, também é um pilar forte para fechar vendas porque a Ranger XL oferece sete airbags, acendimento automático dos faróis, ajuste elétrico de altura dos faróis, assistente de partida em rampa, controle automático de descidas, piloto automático, multimídia com conexão para smartphones, quadro de instrumentos digital e ajuste de profundidade do volante. 

Ford Ranger XL

Das três opções da XLS, 4×2, 4×4 e 4×4 integral V6, todas com câmbio automático, a primeira e a última são focadas em clientes que utilizam mais o veículo para uso pessoal e, às vezes, precisam realizar algum tipo de trabalho. A configuração intermediária deverá ser procurada pelo público que usa o veículo para trabalhar quase que diariamente e aos fins de semana e feriados utiliza a picape para levar a família para passear ou viajar. 

As configurações XLS 4×2 e 4×4 serão vendidas por R$ 235 mil e R$ 260 mil, respectivamente, com o motor diesel 2.0 de 170 cv de potência e câmbio automático de dez velocidades e diversos itens de série como todos os da versão XL mais faróis full led, quatro modos de condução. 

Interior da Ranger XLS V6

A versão XLS 4×4 integral com motor diesel V6 de 250 cv de potência, também desenvolvido para rodar com diesel B20 e acoplado a câmbio automático de dez velocidades, custará R$ 280 mil.

Rodando 700 km com o BYD elétrico mais barato do Brasil

São Paulo – O BYD Dolphin nem bem chegou ao País importado da China e já movimentou o jovem mercado de carros elétricos: ofertado a partir de R$ 149,8 mil foram vendidas 1 mil 250 unidades em agosto, forçando seus concorrentes a baixar os preços para continuar atraindo o consumidor earlier adopter, aquele que tem a necessidade de ser o primeiro a consumir uma nova tecnologia. Ideal para os deslocamentos na cidade como este compacto chinês se comporta na estrada? E quais as preocupações e vantagens que o condutor tem ao viajar com um carro 100% elétrico? Nesta reportagem especial mostraremos como é rodar mais de 700 quilômetros sem emitir um grama de CO2 nem usar um carregador residencial apenas acessando a rede pública de abastecimento disponível no percurso até o Interior do Estado de São Paulo.

Vale destacar que AutoData não tem o costume de publicar reportagens com impressões ao dirigir. Fazemos isto quando se trata de uma novidade ou é absolutamente relevante para o leitor conhecer não só o produto mas, também, o plano de negócios e industrial destinado àquele veículo retratado em nossas páginas editoriais. Pois o BYD Dolphin se enquadra nesses quesitos: ele é o principal candidato a ser produzido no Brasil a partir de outubro ou novembro de 2024 – ou em 2025, conforme apuramos com exclusividade. Além disso apresenta para o mercado brasileiro a evolução da indústria chinesa não apenas nas tecnologias de propulsão mas, também, na construção, no acabamento e no design de seus automóveis.

Visual, ponto forte

Para começar o design exterior e, principalmente, o interior, são destaques deste modelo. A BYD tirou da Audi em 2017 seu chefe de design, o alemão Wolfgang Egger, que a partir daí passou a desenvolver uma nova identidade para a marca chinesa. O Dolphin faz parte da linha de carros com inspiração em elementos do mar. O golfinho está representado no bedge, estampado na tampa traseira. Outro modelo, o Seal, também faz parte desta linha e já desembarcou no Brasil.

A traseira e a dianteira do Dolphin possuem identidade própria: a frente é curta, pois não há a necessidade de cofre volumoso para acomodar um arcaico motor a combustão. A iluminação de led percorre de lado a lado a dianteira, contorna a grade fechada que ostenta seu logo e forma um conjunto harmonioso com os faróis à noite – durante o dia para olhares ainda não acostumados com a novidade a dianteira foi a que causou maior estranhamento. O desenho da parte traseira é um tanto mais clássico, com a tampa do porta-malas tomando quase todo o espaço. Mas novamente a iluminação de led – em vermelho – percorre toda a traseira e forma um desenho muito bonito que chama a atenção e destaca a frase em inglês Build Your Dreams, que é o nome da marca chinesa.

Mas é de lado que o Dolphin arrebata os olhares. Seu design tem personalidade. Um vinco na linha de cintura percorre a lateral e outro ainda mais pronunciado, em diagonal nas portas, cria um visual que não se vê todo o dia nas ruas. As rodas completam esse conjunto moderno e que tem tudo para cair no gosto do consumidor brasileiro.

O Dolphin é um carro elétrico compacto, com pouco mais de 4m10 de comprimento, alguns milímetros menor do que o Chevrolet Onix. Mas seu entre-eixos de 2m70 coloca este modelo em outra categoria. É por isto que seu desenho aparenta ser bem equilibrado do lado de fora. E no interior oferece espaço digno de um Toyota Corolla, um dos modelos médios mais desejados no mercado brasileiro.

Mas não só isto: o habitáculo foi muito bem trabalhado do ponto de vista da estética e da funcionalidade. A qualidade dos materiais empregados no acabamento também é algo que se destaca. E o espaço, que proporciona uma ocupação muito confortável para todos. De fato, comparando com carros compactos feitos no Brasil, o BYD Dolphin fará muitas marcas revisarem seus padrões porque o consumidor que tiver a oportunidade de provar o chinês verá que se trata de outro patamar.

No total, considerando uma parada, foram seis horas na primeira perna da viagem até o Interior de São Paulo, um percurso de 270 quilômetros. Descontando o tempo de carregamento fiquei mais de quatro horas e meia sentado na posição do motorista e posso dizer que não senti o mesmo desgaste fazendo a mesma viagem com outros automóveis nacionais com os quais tive contato nos últimos meses. Isso se deve a dois fatores: o desenho do banco, que é largo tanto no assento quanto no encosto das costas e muito confortável. E aos ajustes para encontrar a melhor posição de dirigir.

O design do interior é algo que surpreende porque ainda não se viu por aqui exemplar feito na China que apresente ao mesmo tempo soluções criativas, minimalistas e de bom gosto reunidos em um só projeto. A pequena tela atrás do volante exibe poucas informações, mas o suficiente para que o motorista possa conduzir o Dolphin. Assim há muito espaço para apreciar o design que mistura três tons e ângulos diferentes em toda a parte frontal. As saídas de ar arredondadas são belas, bem posicionadas e funcionais. O plástico escuro empregado na parte superior do console é de um padrão ainda não alcançado pelos carros nacionais – é o mesmo utilizado nas portas. Dele para a parte inferior há outra peça plástica imitando alumínio escovado com curvas que formam um desenho muito bonito. Ali também estão posicionadas duas das quatro saídas de ar. Na parte inferior, em tom claro e com pequenas gotas impressas em laranja, destaque para o bom gosto e a qualidade do material dessa peça que fará designers brasileiros revisitarem seus conceitos para tentar atingir o mesmo resultado.

As cores do interior conversam com o lado de fora e este é outro ponto interessante para um veículo chinês [inclusive dentro do portfólio da própria BYD] que geralmente exagera em luzes, cromados e design de gosto duvidoso para o cliente do Ocidente mas que é a preferência do consumidor do maior mercado do mundo. O Dolphin e a linha de carros da BYD inspirados em elementos do mar parecem querer mudar este padrão chinês.

São poucas funções disponíveis no console central, e o seu acionamento foge do padrão tradicional: é preciso girar para cima e para baixo os botões arredondados para movimentar o carro para frente ou para trás, ligar ou desligar o ar-condicionado ou aumentar e diminuir o volume do som. Esta peça arredondada feita de alumínio fica abaixo de um porta-objetos emborrachado do tamanho de um smartphone. Há outro console enorme que se estende pelos bancos dianteiros que acomoda todo o tipo de coisas que as pessoas carregam para lá e para cá. Há porta-trecos de sobra no Dolphin.

A enorme tela de 12,8 polegadas concentra todas as funções tanto da dinâmica e demais ajustes do veículo como das opções multimídia disponíveis nos modelos atuais. A disposição das informações e, principalmente, sua sensibilidade ao toque são bem melhores e intuitivas do que em todos os carros nacionais que oferecem o recurso. No entanto houve momentos em que o sistema perdeu contato com o aplicativo Android Auto, função que nos carros nacionais guarda mais estabilidade nesta conexão. Ela também tem o charme já tradicional dos BYDs: gira e pode ser utilizada na vertical. Durante os dias com o Dolphin esta foi a posição preferida deste condutor, Quando conectado com o Android Auto, porém, automaticamente a tela retorna para a posição horizontal e não é possível mudar esta orientação para visualizar mapas e lista de músicas no Spotify.

Atualizando os padrões de condução

Antes de partir para a estrada, rodando quase 50 quilômetros em São Paulo, naquele para e anda, sempre em baixa velocidade, algumas coisas precisam ser destacadas. Primeiramente é uma delícia conduzir o Dolphin no trânsito. Mesmo tendo que pressionar com cuidado e sempre de forma suave o acelerador para obter o melhor desempenho ele é ágil o suficiente para seguir o fluxo e manter a distância do carro da frente evitando que motoristas mal-educados cortem a sua frente. Esta é uma forma de dirigir completamente diferente dos veículos dotados de motor a combustão interna e representará uma mudança, pois privilegia a redução do consumo, no caso de energia.

Até mesmo o ruído que a BYD incluiu de série rodando até 25 km/h para que pedestres possam identificar um veículo se aproximando é algo interessante, diferente. Muitos jornalistas têm criticado o barulhinho agudo, que na verdade não é nem um pouco mais ou menos irritante do que o ruído de um motor a combustão. A diferença é que se trata de uma novidade, e o barulho do motor tradicional já está presente na rotina auditiva das pessoas desde sempre. De qualquer forma é possível eliminar o barulhinho do BYD em suas configurações. No entanto, quando feito isto, notou-se que os pedestres mais desatentos ou olhando para suas telas enquanto caminham [algo cada vez mais normal em São Paulo] deixaram de perceber a aproximação de um veículo silencioso como este elétrico. Quase houve um acidente com um desses pedestres desatentos atravessando a rua sem olhar para os lados. Imediatamente mudei a configuração e voltamos ao barulhinho…

Desafio, estrada!

Bateria carregada, 99%, quase 405 quilômetros de autonomia apresentadas na tela pelo padrão worldwide harmonised light vehicles test procedure, WLTP, partimos para acessar a Rodovia Castelo Branco com destino ao posto Bizungão III, no km 247, onde se encontra um carregador gratuito de 150 kW instalado pela Volvo. No caminho havia outras possibilidades de carregadores mais lentos, de 7 kW, mas como o pessoal da BYD disse que a autonomia aferida pelo Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular, PBEV, do Inmetro, registrava 291 quilômetros de autonomia para o Dolphin, a ideia de parar e perder muito tempo colocando pouca energia pareceu não valer a pena. Mas quando se trata de um carro elétrico melhor planejar melhor a viagem. É como pilotar um avião: é prudente ter um bom plano de voo para não ficar sem combustível.

Logo no primeiro pedágio – são oito até Avaré, o destino final – uma chuva torrencial às 6 da tarde obrigou a utilizar ostensivamente o limpador do vidro dianteiro. Ar-condicionado ligado para não embaçar os vidros e o cair da noite também obrigou a utilização dos faróis, obviamente. Dizem que tudo isto reduz a autonomia, mas acreditando que havia uma bateria tradicional para auxiliar esses equipamentos segui viagem confiando que com autonomia de 291 quilômetros chegaria sem sustos.

Rodando a 110 km/h numa rodovia com velocidade máxima de 120 km/h seu conjunto formado por um motor elétrico instalado no eixo dianteiro com 75 kW ou 95 cv de potência e 18,3 kgfm de torque, alimentado por uma bateria de 44,5 kWh carregava com maestria os 1 mil 815 quilos de peso bruto total do compacto.

Mas é preciso adquirir novos conhecimentos para buscar a melhor eficiência com um carro elétrico. Por exemplo: saber que a Castelo Branco é uma rodovia com muitas subidas, mesmo as mais sutis, é uma delas. Porque quando chega um aclive é necessário pisar um pouco mais forte no acelerador para manter a velocidade. E isto consome muita energia.

Um ótimo professor para essa nova realidade está na telinha do condutor: a quantidade de energia utilizada instantaneamente. Depois de 110 quilômetros, quando consumi 40% da bateria, percebi que era preciso manter o consumo instantâneo em 20 kW, no máximo, 30 kW, para manter a velocidade de 100 km/h a 110 km/h. No entanto, para vencer subidas mais íngremes nesta velocidade tive que consumir, em alguns momentos, 75 kW. E isto cobrou um preço lá na frente.

Nas retas consegui manter o consumo em 17 kW, o que seria ideal durante todo o percurso para chegar ao destino ainda com uma reserva estratégica na bateria. Mas aí a velocidade teria que baixar para 100 km/h, ou menos. E andar mais devagar numa rodovia movimentada como a Castelo Branco não é uma boa ideia porque do lado esquerdo passam os carros que viajam mais rápido. E do lado direito muitos caminhões e ônibus também rodam no ritmo de 90 km/h a 100 km/h, ou um pouco mais, obrigando o motorista de um automóvel mais lento manter a atenção redobrada e fazer muitas manobras para evitar estas duas situações.

Quando restavam 25% da bateria rolou um dilema: continuar até o carregador rápido ou parar no último posto com um wallbox de 7 kW? Faltavam 50 quilômetros e o painel mostrava 100 quilômetros de autonomia. Só que no meio deste caminho havia a Cuesta, mais conhecida como a serra de Botucatu, e ali a autonomia baixou rapidamente obrigando a reduzir a velocidade, desligar o ar-condicionado e começar a fazer contas. No fim, rodando a 95 km/h, depois a 80 km/h nos últimos dez quilômetros chegamos no posto Bizungão III com 7% de bateria e 26 km de autonomia.

Esta é uma margem muito pequena antes de ficar literalmente sem energia. Foram 248 quilômetros na estrada durante quatro horas e meia, o que consumiu 39,4 kW de um total de 44,5 kW de energia da bateria Blade da BYD. É importante registrar a angústia durante os quilômetros finais, fazendo contas, reduzindo bastante a velocidade e pensando que atitude tomar quando a energia terminasse.

Por tudo isto não vale a pena viajar com um carro elétrico nestas condições. É preciso ter mais planejamento para uma viagem longa com veículos elétricos com autonomia limitada para esses percursos e, sobretudo, mais oferta de carregadores públicos para que os carros elétricos possam fazer sentido em um país continental como o Brasil. Se o objetivo é eliminar o CO2 da mobilidade particular basta utilizar apenas etanol em um automóvel tradicional que o motorista consciente dará grande contribuição ao meio ambiente.

A saga do carregamento

Eram quase 11 da noite quando instalei o plug do carregador DC oferecido gratuitamente pela Volvo no posto Bizungão III, no km 247 da Castelo Branco. Com 7% a máquina contabilizou exatos 65 minutos para o carregamento total. Mas não foi isto o que aconteceu. Demorou 1 hora e 37 minutos até os 100% de carga, e os 20% finais demoraram uma eternidade – longos 35 minutos, quase um terço do tempo total. Isto se deve à temperatura interna da bateria. A 80% seu sistema interno que controla tudo isto reduz substancialmente a quantidade de energia que entra para não sobrecarregar os packs de íon-lítio e assim evitar uma combustão espontânea. Claro que isso é muito difícil de acontecer mas não impossível. Por isto há o sistema eletrônico de controle que, no fim das contas, toma ainda mais tempo do condutor.

Torque demais e sai de frente

Alguns dias com energia de sobra e tempo em Avaré foi possível conhecer melhor o comportamento dinâmico do BYD Dolphin. Nestes momentos rodamos de forma mais esportiva, sempre com total segurança e respeitando as normas em ruas e rodovias, tentando levar o veículo ao limite em curvas e acelerações. Veredito: o automóvel elétrico se comporta de forma diferente na comparação com um modelo com motor a combustão dianteiro. A razão é que justamente em modelos com tração dianteira como o Dolphin não há o peso do motor na frente. Sem este arrasto adicional o carro tem sua dianteira mais leve e solta com o aumento da velocidade e sai de frente em qualquer curva mais acentuada. Mesmo em ultrapassagens é preciso manter a atenção e as mãos firmes no volante para não perder o controle. O torque imediato pode assustar motoristas menos experientes fazendo-o perder por instantes o controle do veículo. De fato carro elétrico não é para qualquer um: é preciso passar por um período de adaptação antes de controlá-los da mesma forma que os tradicionais que estamos mais acostumados ao dirigir esportivamente.

Depois de alguns dias rodando em Avaré, consumindo 50% de bateria, planejamos melhor a viagem de volta a São Paulo. A primeira parada foi no posto Bizungão III, mas dessa vez paramos por apenas 25 minutos para levar a bateria a 80% da sua capacidade. A ideia foi realizar mais uma parada para carregamento usando aplicativos que mostram onde estão os carregadores públicos.

Traçamos a rota com a parada programada no único carregador DC disponível na Castelo Branco próximo da Capital. Estava há 189 quilômetros do posto Bizungão III e desta forma mantivemos a velocidade de cruzeiro de 120 km/h, utilizando o piloto automático, o que manteve o consumo instantâneo em 30 kW. Dessa forma chegamos ao carregador de 90 kW da Tupinambá com 26% de bateria e apenas 107 quilômetros de autonomia.

E aí nos deparamos com a realidade que em breve será a dos condutores de um carro elétrico: a Tupinambá cobra R$ 1,95 por quilowatt. Ou seja, quem acredita que a energia será gratuita para sempre, pode esquecer. Para abastecer carro elétrico teremos que pagar. Por enquanto ainda é um valor menor comparado com o preço dos combustíveis líquidos. Mas quem garante que será sempre assim?

Bem, depois de 75 minutos para carregar de 26% para 80% a Tupinambá cobrou R$ 50 por 21,1 quilowatts. E aqui outra lição importante: a capacidade das estações de carregamento influenciam no tempo da viagem. Levamos quase o mesmo tempo para encher com 80% a bateria num carregador com 90 kW que foi necessário para carregar de 7% a 100% a bateria em um aparelho com 150 kW.

Quem está interessado em um carro elétrico precisa ter consciência de que para cumprir grandes distâncias é necessário fazer contas, muitas contas, ficar atento na velocidade em que é consumida a energia, que tem a ver com a forma como ele conduz o veículo, ter uma série de ferramentas para não ficar sem energia no percurso e, por fim, ser alguém com paciência de sobra. Sem tudo isto atualmente as possibilidades de voltar para casa com o carro numa plataforma é grande.

No entanto é gostoso dirigir um carro elétrico. E este chinês, como foi descrito, tem diversos atributos de que o consumidor brasileiro gostará e aprovará. Há muito o que evoluir em termos de oferta de infraestrutura. Depois de mais de 700 quilômetros cumprimos o desafio de viajar e enfrentar as dificuldades que muitos desses clientes terão a partir de agora.

No ano passado a BYD vendeu na China 204 mil 674 Dolphin. Por aqui um lote com mais 3 mil unidades desembarcou nos últimos dias de agosto. Segundo a BYD todos estarão rapidamente nas ruas porque a procura está muito além das suas próprias expectativas.

Fotos: Leandro Alves

Um de cada cinco veículos importados pela América Latina é chinês

São Paulo – Ao longo de uma década a China tornou-se o principal exportador para a América Latina, ao saltar de 4,6% para 21,2% do total de produtos importados pelos países da região, com exceção do Brasil. Levantamento realizado pela Anfavea aponta que os produtos asiáticos estão tomando espaço de veículos fabricados na região, como os brasileiros, que perderam a liderança no ranking: no mesmo período em que os chineses galgaram 16,5 pontos porcentuais no total das importações de países latinos o Brasil recuou 3 pontos porcentuais, ao reduzir sua representatividade de 22,5% para 19,4%.

Na avaliação do presidente da Anfavea, Márcio de Lima Leite, “há uma invasão de produtos chineses na região e se o País não avançar neste mercado acaba perdendo terreno para outros que estão chegando”.

O crescimento chinês tomou espaço também de outros gigantes, como Estados Unidos e Canadá, que recuaram 3,8 pontos porcentuais, de 21,7% para 17,9%, e Japão e Coreia do Sul, que perderam 7,1 pontos porcentuais ao passarem de 19,8% para 12,8% do total de importações da região.

Além disso países da União Europeia tiveram participação reduzida de 12,9% para 8,3%, ao encolherem 4,6 pontos porcentuais, e o México passou de 6,8% para 3,9%, recuo de 2,9 pontos porcentuais.

Ao lado da China Índia e Indonésia ampliaram sua representatividade na região. Os indianos avançaram os mesmo 2,9 pontos porcentuais perdidos pelos mexicanos, e passaram de 2,2% para 5%. E os indonésios, até então sem tradição nessa indústria, subiram de 0,2% para 1,5%, incremento de 1,3 ponto porcentual.

“Trata-se de cenário muito preocupante. Estamos perdendo competitividade e o nosso mercado tradicional. Enquanto isso os asiáticos estão entrando com preços baixos e tomando espaço.”

Em vinte anos chineses passaram de quarto a maior produtor global

Outro estudo realizado pela entidade com base nos dados da Oica mostra que nos últimos vinte anos diversos países ampliaram sua produção focados no mercado de exportação. A China, por exemplo, avançou do quarto lugar, em 2003, para líder automotiva mundial, em 2022, com 27 milhões de veículos produzidos.

“Os países não estão focados nos seus mercados internos e, desta forma, seguem ampliando sua produção”, disse Leite, ao lembrar que, em 2006, por exemplo, os chineses produziam 4 milhões de unidades. Hoje esse o volume se multiplicou por quase sete vezes.

Os Estados Unidos, neste período, caíram para a segunda colocação, com 10,1 milhões de unidades. Na terceira está o Japão, que também perdeu uma posição, com 7,8 milhões de veículos. Em quarto lugar aparece a Índia, com 5,5 milhões de unidades — duas décadas atrás estava na décima-quarta posição.

O Brasil, neste período, ganhou duas posições – tendo ocupado a sexta colocação em 2008 e 2009 – e é, hoje, o oitavo maior produtor do mundo, com 2,4 milhões de unidades, atrás de México, com 3,5 milhões, Alemanha, com 3,7 milhões e Coréia do Sul, com 3,8 milhões, além dos demais citados.

Passado o período mais agudo da pandemia, e da escassez de semicondutores, o mercado global avançou 6,7%, com 84,1 milhões de veículos de julho de 2022 ao mesmo período em 2023.

“O Brasil é um País que não perde a oportunidade de perder uma oportunidade. Continuamos na faixa de 2,4 milhões, estamos andando de lado. Não é que o Brasil deixou de crescer, mas está perdendo espaço no mercado global pois, à medida que o mundo cresce e o País se mantém estável, há a perda de competitividade no cenário global.”

Neste período de um ano a China cresceu 4,2%, para 25,6 milhões de unidades. A América Latina, por sua vez, ampliou suas vendas em 1,3%, para 3,8 milhões de unidades.

O dirigente destacou que se China, Índia e Indonésia ampliaram suas exportações para a América Latina nos últimos anos, mas o Brasil não, liga-se sinal de alerta: “O País diz que não consegue exportar. Mas se os mercados continuam sendo ampliados, quem é que está vendendo a eles?”.