São Paulo – A ciência quer provar que o Brasil é o País dos biocombustíveis e que há opções viáveis à eletrificação, em busca da descarbonização, a partir da geração de etanol de agave. A planta suculenta é comum no México e dá origem à tequila, mas também é abundante no sertão nordestino, especialmente na Bahia, e pode ser mais uma fonte de combustível de baixa emissão de CO2.
Os especialistas Gonçalo Pereira, engenheiro agrônomo coordenador do Laboratório de Genômica e Bioenergia do Instituto de Biologia da Unicamp, e André Oliveira, diretor do Senai Cimatec, contaram, durante o Seminário Elétrico + ESG realizado por AutoData, sobre o Programa Brave, que visa à produção de bioenergia a partir do agave.
A primeira fase, de geração das bases científicas e técnicas para uso da planta como fonte de biomassa, foi encabeçada pela Unicamp em parceria com a Shell. Agora, com o Senai Cimatec, o plano é desenvolver, em um prazo de cinco anos, a mecanização do plantio e da colheita, assim como rotas tecnológicas para obtenção de etanol de primeira e segunda geração e pirólise – processo de decomposição térmica da biomassa – para gerar biogás, bio-óleo e biochar ou biocarvão.
Oliveira contou que parte deste processo ocorrerá no Cimatec Park, espaço de 4 milhões de m² lançado há quatro anos, no Complexo Industrial de Camaçari, BA, que propõe o escalonamento de novos processos, abriga plantas-piloto, produz protótipos e os testa em escala real.
“Comum no plantio do semiárido nordestino, principalmente na Bahia, o agave sisalano hoje só tem de 4% a 5% de sua biomassa utilizada. O restante é deixado no campo. A ideia é não ter resíduo e utilizá-lo completamente ao criar uma nova cadeia de negócios.”
O diretor do Senai Cimatec contou que a entidade está adquirindo área de 700 hectares no sertão baiano com o objetivo de plantar, nesta etapa, 50 hectares de agave sisalana e também da tequilana, com o objetivo de buscar opções de combinação e manuseio.
Pereira citou artigo australiano que aponta que, a cada hectare plantado com agave, o potencial de geração de etanol é de 7 mil 414 litros por ano. O que significa que no espaço mencionado por Oliveira podem ser gerados 370,7 mil litros. Em 1 mil hectares o volume cresce a 7,4 milhões e, em 10 milhões de hectares, 74,1 bilhões.
“O sertão brasileiro possui 108 milhões de hectares, sendo 28 milhões de hectares somente no Sertão da Bahia. O Brasil produz hoje 30 bilhões de litros de etanol, o equivalente a 3,3 milhões de hectares do sertão. Olha o tamanho da oportunidade.”
O programa Brave, que reúne centenas de pesquisadores, segundo o especialista da Unicamp, está acontecendo antes de algum investidor fazer aporte no campo para gerar recurso. Esse é um diferencial, segundo ele, em comparação ao programa do biodiesel.
O diretor do Senai Cimatec complementou que a iniciativa busca testar a viabilidade de uma cadeia de negócios ao permitir que os estudos sejam levados do laboratório para a produção piloto, em um galpão de 1,5 mil m².
Trata-se de contexto mais amplo que, em sua avaliação, confere robustez ao plano que, diante do sucesso nos testes, a indústria poderá começar a investir nesta produção, ao mesmo tempo em que a agricultura familiar deverá ser impulsionada com mais uma opção de plantio e, consequentemente, renda.
Análise que vai ao encontro da avaliação de Pereira quando diz que o maior problema da humanidade não é o aquecimento global mas a desigualdade, ao defender a manutenção de veículos a combustão, só que movidos a bioenergia: “Peça é emprego. Tirou a peça, tirou o emprego. Tirou o emprego, não tem quem compre”.