“Muita saúva, pouca saúde. Os males do Brasil são!” Com esta frase, eternizada no clássico da literatura brasileira, Macunaíma, escrito na primeira metade do século passado, Mário de Andrade tentou mostrar que em uma sociedade predominantemente agrária, como o era naquela época, qualquer praga que prejudicasse a produção poderia ser muito ruim para o povo.
Hoje, para ilustrar a realidade da economia brasileira, na qual a produtividade e a competitividade têm se mostrado como os principais obstáculos rumo ao desenvolvimento, talvez seja melhor usar outra frase que, no mesmo livro, era dita o tempo todo pelo seu personagem central, o próprio Macunaíma: “Ai, que preguiça…”.
Guardados os devidos exageros demonstra bem a marcha à ré que o Brasil engatou nos últimos anos no que se refere às atividades industriais.
Na semana passada a Confederação Nacional da Indústria, CNI, divulgou o seu estudo de competitividade, refletindo o ambiente de negócios vivido ao longo de 2014. Dentre quinze países estudados o Brasil ocupou a penúltima posição, à frente da Argentina. A lista incluiu também Colômbia, México, Polônia, Turquia, Índia, Rússia, África do Sul, Chile, China, Espanha, Austrália, Coréia do Sul e Canadá.
Este estudo referenda o Relatório de Competitividade Global, divulgado em setembro do ano passado pelo WEF, Fórum Econômico Mundial, que colocou o Brasil na 57ª posição de 144 países.
Também neste caso ficamos atrás de vários vizinhos da América Latina, como Chile, 33º, Panamá, 48º, e Costa Rica, 51º. E também dos outros companheiros do Bric, China, Rússia e África do Sul que ficaram nas 28ª, 53ª e 56ª posições.
A maior e mais perigosa coincidência destes dois estudos reside no fato de apontarem a produtividade como o maior problema atual do Brasil. O trabalho da CNI, por exemplo, revela que, em comparação aos outros catorze países, estamos bastante atrasados nos fatores disponibilidade e custo da mão de obra e de capital, infraestrutura, peso dos impostos, ambientes macro e microeconômicos, educação e tecnologia e inovação.
Já na avaliação do WEF a situação também foi quase dramática, com o Brasil ocupando o 85º lugar em desempenho macroeconômico e tendo uma das piores avaliações em educação, 126ª colocação. E isto, segundo o estudo, deixa claro que o País não consegue, em teoria, fornecer trabalhadores com o conjunto de habilidades necessárias para uma economia que está em processo de desenvolvimento.
O peso dos impostos é outro item que aparece no topo dos principais problemas nos dois estudos. No trabalho da CNI o Brasil ficou na décima-terceira posição dentre os quinze países estudados. No da WEF também foi citado como um dos principais fatores a serem resolvidos no futuro, seguido das regulamentações trabalhistas.
Na prática tudo isto significa que a economia brasileira não vem sendo gerida com a eficácia necessária nos últimos anos, sobretudo no que diz respeito à alocação e à administração dos recursos arrecadados que, convenhamos, não são poucos. E explica um pouco da fuga de capitais que temos assistido nos últimos anos, com mais e mais empresários e executivos, notadamente de grandes multinacionais do setor de autopeças, gritando aos quatro ventos que estão sistematicamente perdendo investimentos para outros países.
A junção de tudo isto, política tributária, trabalhista, falta de investimento em educação, infraestrutura ruim, etc, acaba meio que desembocando em um vertedouro estreito que responde pelo nome de produtividade que, num grande resumo, funciona quase como sinônimo de competitividade.
A partir daí é lógico que a falta de preparo do nosso trabalhador e a própria legislação trabalhista brasileira são assuntos que devem ser resolvidos com urgência. Só que atrelar os nossos problemas somente a isto é um erro que deve ser evitado, pois a nossa baixa produtividade tem origem mais ampla e profunda e aspectos como infraestrutura defasada e burocracia talvez até sejam mais importantes.
Estão estamos perdidos? É claro que não. Existem exemplos que mostram que, mesmo com todas as limitações atualmente encontradas no Brasil, é possível destacar-se nesta questão da produtividade. A agricultura brasileira é um deles e viu sua produtividade crescer com índices chineses nas últimas décadas.
O problema é que continuamos presos aos movimentos do governo e de sua nova equipe econômica. E, pelos primeiros passos dados, se antes a situação para a indústria estava ruim em termos de competitividade pode ficar ainda pior nos próximos meses, porque os custos estão subindo no Brasil e caindo no resto do mundo.
Recuperação tributária, reajuste de 30% na energia elétrica, aumento do aço, cotação dos derivados de petróleo em alta internamente, tudo isto além dos estoques altos advindos do ano passado, são alguns dos problemas que surgiram com força nos primeiros dias deste ano. E podem estar colocando em risco o tão esperado cenário de recuperação da indústria.
Por tudo isto é bom deixar a preguiça de lado.