De maneira geral, tinta automotiva é o resultado da mistura de resinas, pigmentos, solventes e aditivos. Cada montadora possui sua fórmula específica, o que significa dizer que o branco de uma não é o mesmo branco de outra. Isso não mudou muito desde a controversa frase atribuída a Henry Ford para tornar seu modelo T mais acessível: “O cliente pode ter o carro pintado na cor que desejar, contanto que seja preto”. Os revestimentos, claro, se tornaram mais resistentes às intempéries, aos riscos e à oxidação. Novas cores foram desenvolvidas, especialmente as metálicas e as perolizadas.
O segmento, porém, protagoniza mais uma evolução, desta vez no processo e na aplicação. “A tendência é de que as montadoras migrem para a tecnologia que utiliza solvente base de água”, revela André Oliva de Palma, gerente de laboratório e desenvolvimento de tintas automotivas da Basf para a América do Sul. “O processo aumenta quantidade de sólidos, no caso pigmentos, e reduz a emissão de compostos voláteis orgânicos, portanto, menos poluentes. É assim na Europa e as novas fábricas no País já nascem assim.”
De acordo com Mateus Aquino, diretor de negócios OEM da Axalta, o processo de pintura com tintas a base de água é mais uma etapa evolutiva sem volta. O executivo estima que do parque industrial automotivo brasileiro, 40% das fábricas já utilizam o produto tendo água como solvente. “Trata-se de uma tecnologia global que representa um marco na trajetória dos fabricantes de tintas para o setor automotivo. Depois de reduzirmos a quantidade de solventes no processo com mais pigmentos, entregamos agora um produto ainda mais correto do ponto de vista ambiental.”
Os fornecedores de tintas já estão prontos. A mudança no parque industrial automotivo brasileiro, no entanto, não é processo que se faz da noite para o dia. “A alteração nas linhas ainda deve levar algum tempo, pois demanda muito investimento,” destaca Carlos Máximo, gerente regional de vendas da Akzo Nobel para a América do Sul no setor automotivo OEM. “A complexidade de controle do processo de pintura a base de água é bem maior, embora seja mais barato, mais prático e de menor impacto ao meio ambiente.”
A tinta à base de água ainda não uma realidade plena nas fábricas de veículos brasileiras. Não quer dizer, porém, que a indústria fornecedora parou no tempo: além da crescente tendência de substituição dos derivados do petróleo pela água, fabricantes de tintas também buscam soluções por meio de matérias-primas e na aplicação. “Evolução contínua que proporcione um revestimento mais leve, portanto que gere economia, e que ao mesmo tempo proteja o veículo é obrigação”, diz Cindy Niekamp, vice-presidente sênior de revestimentos OEM do setor automotivo da PPG. “A consequência leva também à redução de custos, de emissão e de energia.”
Trocando em miúdos, a executiva da PPG resume que ao longo da trajetória da indústria de tinta automotiva as empresas conseguiram entregar produtos e processos mais eficientes. “O trabalho de laboratório na formulação de primers e vernizes resultou em tintas mais nobres”, completa Máximo, da Akzo Nobel. “No caso, não só ocorreram melhorias no aspecto, mas também facilitaram a aplicação sobre a chapa, a aderência e a redução de material.”
AGILIDADE – Bom exemplo prático do que a indústria de tintas provoca na área de pintura das fábricas de veículos é o que se denomina processo integrado ou compacto, a depender da empresa. De modo simplificado, O novo sistema eliminou etapas de secagem das camadas de revestimento aplicadas à carroceria. “Primer e base são empregados juntos, sem necessidade, como antes, de um período na estufa para cada uma”, conta o gerente da Basf. “Além do benefício de aumento na produtividade da operação, há uma economia de energia de 15% a 20% e redução da emissão de CO2 de 20% a 30%.”
A vice-presidente da PPG também destaca as vantagens para o processo integrado de pintura. Cindy Niekamp vai ainda mais longe e descreve sistema no qual das quatro camadas de tintas, três ocorrem sem a necessidade de estufas entre elas, ou seja, “três etapas molhadas para uma seca. Trata-se de tornar o processo mais rápido, reduzir custos e possibilidade de modernizar a linha a partir de um investimento menor. Há casos em que a economia de energia chega a US$ 50 por veículo”.
Os novos processos de pintura, além de configurar mais velocidade à linha, também somam conceitos que contribuem com a competitividade da operação da montadora. Cabem no pacote, por exemplo, tintas mais simples de preparar, de usar e que garanta boa qualidade na cobertura com menor quantidade. “Produtos que ofereçam menor consumo por litro impactam em duas frentes”, aponta o gerente regional da Akzo Nobel. “No menor custo da operação no chão de fábrica e no frete do transporte, pois contabilizará volumes menores.”
Necessidade de menos tinta, aliás, faz parte desta caminhada evolutiva das empresas fornecedoras de revestimentos. “A cobertura de tinta de um carro hoje é mais fina que um fio de cabelo”, afirma Oliva de Palma, da Basf. “Resultado da busca por produtos mais leves, que influencie na redução das emissões, tanto no processo produtivo quanto no veículo.”
Todo o desenvolvimento de novas tintas e processos de pintura está associado ao custo e ao meio ambiente. Mas também dependem de ciclos de investimentos a fim de modernizar o chão de fábrica, principalmente das instalações fabris de veículos mais antigas. “Tem muita coisa pronta, como vernizes capazes de melhorar a aerodinâmica dos carros”, lembra o representante da Akzo Nobel. “Ou processos que demandam menos tempo de cura da tinta em estufas equipadas com lâmpada ultravioleta, operação já feita com peças menores, mas que não há impedimentos para chegar à carroceria.”
Segue por esta seara apontada pelo executivo revestimentos mais resistentes a riscos ou mesmo repelentes a sujeira. “Há muito ainda a se fazer para ajudar o cliente, mas está atrelado a investimentos”, reforça da vice-presidente da PPG. “No momento trabalhamos em uma tecnologia que torne mais fácil a limpeza do carro, por exemplo. Vale destacar, porém, que a cor, depois do modelo, é a segunda pergunta que o consumidor faz para si mesmo na hora de comprar um carro. A tinta precisa ser duradoura, mas também bela.”
A análise é enfatizada pelo diretor a Axalta, que trata os efeitos na cor, as opções foscas ou mesmo as superfícies super-resistentes como uma visão para o futuro, tecnologias ainda restritas ao laboratório. “Alguns desenvolvimentos dependem de adaptação à realidade de produção para se tornarem viáveis em grande escala. Hoje já vivemos um enorme avanço, com maior oferta de cores e aperfeiçoamentos no aspecto promovido na carroceria do veículo.”
EXPANSÃO – Apesar da projeção de um período delicado pela frente, a área dá provas de confiança no ambiente no futuro próximo. A PPG acaba de inaugurar uma fábrica de resinas e-coat em Sumaré, SP, especialmente para abastecer a indústria automotiva. A unidade recebeu investimento R$ 100 milhões e se soma a outras cinco fábricas já existentes no terreno. “É um marco industrial”, ressalta Carlos Santa Cruz, diretor presidente da companhia para o Brasil e América do Sul. “Introduz no País o que existe de mais moderno em processos e produto”.
Também a Akzo Nobel prepara-se para iniciar operação de um centro de aplicação até o fim de abril. O local permitirá à empresa reproduzir os processos dos clientes e, assim, entregar soluções mais eficientes. “Começaremos a simular agora o que a montadora precisará em 2016, 2017”, revela Carlos Máximo, gerente regional de vendas da Akzo Nobel para a América do Sul no setor automotivo OEM.
E a tendência de que tintas a base de água é um passo sem volta faz com que a Axalta invista US$ 32 milhões na sua unidade de produção para este tipo de produto em Guarulhos, SP. “Iremos dobrar nossa capacidade fabril”, resumo Mateus Aquino, diretor de negócios OEM da companhia para o Cone Sul.