Na noite da segunda-feira, 25, a Anfavea ganhou seu décimo-oitavo presidente em 60 anos de existência, fundada que foi em 15 de maio de 1956. Cerca de quatrocentos profissionais basicamente ligados ao setor automotivo estiveram presentes à solenidade, realizada nos salões do clube Monte Líbano, em São Paulo.
Abaixo seguem trechos escolhidos do discurso de posse de Antônio Megale.
“(…) A indústria automobilística atualmente passa por um período complexo. Talvez um dos momentos mais difíceis da sua história, provocado pela crise política que tem impactado fortemente a economia do País. Depois de mais de uma década de crescimento forte e de investimentos na construção de novas fábricas, modernização das já existentes e lançamentos de novos produtos, a indústria apresenta capacidade instalada superior a 5 milhões de unidades por ano.
Contudo, temos uma capacidade ociosa de 50% na média da indústria. Em alguns segmentos, como o de veículos pesados, esta ociosidade atinge 80%.
Isso é consequência direta da queda de confiança do consumidor, que com medo do desemprego deixou de comprar. E os empresários, sem uma visão mais clara do futuro, repensam seus investimentos. Esta crise é de confiança.
Na área de máquinas, por exemplo, não existe o menor motivo para queda tão expressiva. Estamos em fase de recordes consecutivos do agronegócio, com safras que permitiram bons resultados, pois se reduções aconteceram nas cotações internacionais foram compensadas pela forte alta do dólar.
Isto preocupa em particular, pois as máquinas no campo brasileiro operam muito mais do que as norte-americanas e europeias e, portanto, desgastam mais também. O motivo é simples: aqui temos até três safras por ano. (…) Há três anos estamos com queda nas vendas de máquinas e isto vai comprometer o futuro da nossa produtividade agrícola.
Por estas razões mais do que nunca temos de aproveitar esta oportunidade para promover ações estruturantes, pois assim que esta crise passar sairemos dela muito mais preparados para o novo ciclo de crescimento.
Dentre estas ações estruturantes estão os financiamentos para aquisição de bens de capital, pois é possível, sim, agir no sentido de oferecer previsibilidade das condições e estabilidade dos recursos, pois isso facilita o planejamento de todos. Não há nada pior para uma empresa quando as regras se alteram no meio do jogo.
Nos últimos anos, por exemplo, tivemos mudanças de última hora ou demora de definições que prejudicaram o segmento de caminhões. Tivemos anos com dez meses e não com doze.
Da mesma forma precisamos nos preocupar com a melhoria do transporte urbano e rodoviário de passageiros. Precisamos de soluções técnicas e racionais para melhorar todo o sistema de locomoção das pessoas tanto nas grandes cidades quanto na interligação delas. Outras ações pelas quais continuaremos a batalhar são a inspeção veicular e o programa de sustentabilidade veicular.
Já passamos da hora de termos um programa de reciclagem contínua dos nossos veículos. Os benefícios de um programa como este englobam a redução de emissões, redução de acidentes nas vias, aumento da segurança e até melhoria na saúde pública.
Precisamos aumentar a competitividade do nosso setor. Temos de aumentar nossa produtividade. É hora de flexibilizar. É o momento de aprofundarmos o diálogo com os trabalhadores e discutir questões importantes para alcançarmos grandes conquistas, como foi o caso recente do PPE, Programa de Proteção do Emprego. Além disso precisamos lembrar que temos uma das cargas tributárias mais altas do mundo. Sabemos da importância do ajuste fiscal na economia, mas o nível de tributos está muito acima do suportável pelas empresas. Se tivéssemos uma carga tributária menor não tenho dúvida de que o principal ganhador seria o consumidor.
Em contraponto ao mercado interno estão as exportações. Vivemos hoje um momento extremamente favorável em razão do câmbio e precisamos aproveitar esta oportunidade. Por isso continuaremos, em conjunto com o governo, apoiando a busca por novos parceiros comerciais e de melhoria da nossa competitividade. Mas para atingirmos estes objetivos não basta ter montadoras fortes e consolidadas. Precisamos ter uma cadeia de valor igualmente forte.
De um lado nossas indústrias de autopeças merecem toda atenção, pois sem uma rede de fornecedores fortalecida seria inviável fabricar no Brasil. Na outra ponta precisamos dar mais atenção ao pós-venda. As concessionárias estão se reinventando e buscando novas formas de tornar viáveis seus negócios. Ao mesmo tempo os consumidores estão cada vez mais exigentes por produtos e atendimento de qualidade não só no ato da venda, mas na parte de serviços.
É pensando no fortalecimento de toda a cadeia que, com certeza, darei continuidade a uma das principais conquistas da gestão atual, que é a união das diversas entidades. Nunca tivemos tantas reuniões, encontros e conversas com os diversos elos que compõem a indústria. Com base nesta união é que daremos início às conversas para a criação de uma nova política industrial pós Inovar-Auto, que se encerra em 2017. Acredito que será uma política com muito foco na cadeia de suprimentos, eficiência energética, tecnologia, pesquisa e desenvolvimento e segurança veicular.
É hora de preparar o futuro.
Vivemos um tempo de mobilidade, no qual a vida nos grandes centros urbanos deve contemplar a integração de todos os tipos de transporte e melhorar a qualidade de vida das pessoas. A conectividade é uma demanda global e já virou realidade no nosso País. As novas tecnologias de propulsão também vieram para ficar. São diversas formas de gerar energia, desde a evolução do motor a combustão, passando pelos híbridos e elétricos, até chegar ao veículo movido a célula de combustível.
Exatamente pelo arrojo que o Brasil teve na questão das alternativas energéticas é importante lembrar que na semana passada foi assinado o COP 21, o mais ambicioso acordo climático global com a aprovação de 195 países, dos quais cerca de 170 já assinaram o protocolo que reduz nas próximas décadas o consumo de combustíveis de origem fóssil.
Neste ponto temos que lembrar do nosso etanol e do Proálcool, o programa de combustível renovável mais bem sucedido em todo o mundo. Temos que utilizar a experiência adquirida com o etanol para incluí-lo nestas novas tecnologias que são pesquisadas no mundo todo.
Como podem ver temos inúmeros desafios para resolver e vertentes para avançar. (…) É a hora de buscarmos o consenso pelos melhores caminhos a percorrer. Temos que envolver todos os setores, reunir nossas câmaras setoriais, nossas comissões internas e trabalharmos arduamente na solução de consenso de todos os entraves. Esse é o compromisso que assumo a partir de agora como presidente da Anfavea.
(…) Agora, senhoras e senhores, quero encerrar meu discurso deixando uma mensagem diferente. Sou oriundo do Interior das Minas Gerais. Nasci em Poços de Caldas. Da vida entre as montanhas surgiu o jeito mineiro de pensar, refletir, compor, escrever e filosofar. E na passagem pelas diferentes empresas de minha carreira trabalhei com executivos alemães, franceses, americanos e japoneses. Já vi, portanto, diversas opiniões e visões.
(…) Não tenho nenhuma dúvida de que a nossa indústria e o nosso Brasil têm um potencial brilhante. Não podemos analisar apenas o momento atual. Temos que olhar o todo. Somos todos brasileiros. E todos queremos apenas um Brasil melhor, com mais oportunidades, onde a indústria entregue sua contribuição contínua ao País.
Assim, termino meu discurso dizendo que o Brasil vai retomar o caminho do crescimento, do desenvolvimento da economia e da sociedade. Vamos ver os nossos produtos inseridos como parte integrante de um sistema de mobilidade que contemple todos os modais. Um sistema que faça os brasileiros sentirem orgulho de sua indústria, dos veículos aqui produzidos, da tecnologia desenvolvida por nós.
(…) Senhoras e senhores: sonhemos juntos e transformemos os nossos sonhos em realidade.”