Depois de ter registrado queda de 27,9% nas vendas domésticas de veículos nos quatro primeiros meses de 2016, em comparação com o mesmo período do ano passado, a Fenabrave abriu esta semana revendo para baixo sua projeção para este ano. E muito para baixo.
Alarico Assumpção Júnior, presidente da entidade, iniciou este ano com projeção de queda de 5,8% nas vendas de veículos em 2016 – o que, aliás, já representaria um mau resultado na medida em que significaria a manutenção para baixo da curva de tendência de comercialização do setor.
Pois bem: de acordo com a nova projeção da Fenabrave a queda das vendas de veículos neste ano poderá ser quase de três a quatro vezes maior do que o inicialmente projetado: 18% nos automóveis, 27% nos comerciais leves, 22% em caminhões e 23% nos ônibus.
A se confirmar esta nova projeção da entidade será o quarto ano seguido de queda nas vendas do setor, com o agravante de que, desta vez, a queda acentuada de vendas se dará sobre uma base já deteriorada pela redução igualmente acentuada de 26% registrada no ano passado.
Do pico, 3,8 milhões de veículos comercializados em 2012, ao vale, 2 milhões 50 mil unidades a serem licenciadas este ano, o mercado brasileiro terá se reduzido praticamente pela metade em quatro anos. Ou até além da metade, se tomados, em particular, os segmentos de caminhões e ônibus.
Quando o processo se iniciou, em 2013, o máximo que os executivos do setor projetavam para o futuro era leve marolinha. Queda no ano inferior a 10%, fruto de uma espécie de ajuste mais estrutural do que conjuntural após um longo período de rápido e acentuado crescimento.
Como o poço era mais fundo, muito mais fundo do que inicialmente se projetava, desde então, a cada novo ano, estes mesmos executivos se perguntam, no momento de fazer a aposta do budget, se este fundo já teria, enfim, sido alcançado. E o ano seguinte se encarrega de mostrar que, infelizmente, ainda não.
Trata-se de um quadro que comprova, mais uma vez, o quanto as vendas de veículos, sobretudo as de automóveis, comerciais leves e caminhões, são umbilicalmente dependentes da disponibilidade de crédito e da confiança dos consumidores com relação ao futuro.
Foi justamente o agravamento do cenário nestas duas frentes que acabou transformando aquela marolinha projetada inicialmente no verdadeiro desastre que se seguiu e a todos colheu de surpresa.
Tudo se iniciou quando os bancos reagiram a uma pequena elevação da inadimplência nos financiamentos de automóveis com aumento da seletividade e com elevação das taxas de juros. Tudo casado com redução praticamente pela metade nos prazos com os quais operavam.
Nos caminhões o próprio governo encarregou-se de trocar juros negativos e financiamento de 100% do valor dos veículos por outro sistema com juros reais e obrigatoriedade de uma entrada que, dependendo do porte da empresa solicitante do crédito, poderia chegar a 50% do valor. E como a troca de sistema feita de supetão, o mercado literalmente parou do dia para noite.
O rumo do inferno estava devidamente traçado. Sem crédito as vendas de automóveis caíram. Sem vendas a produção foi reduzida. Sem produção vieram as férias coletivas e as demissões. Com as demissões a inadimplência aumentou.
E, em resposta, os bancos ficaram ainda mais seletivos, aumentaram ainda mais os juros e reduziram ainda mais o prazo. E com a redução ainda maior do crédito as vendas caíram ainda mais e…
As demissões trouxeram, também, a insegurança dos consumidores com relação à manutenção do emprego e, por decorrência, a tendência de evitar ao máximo contrair qualquer tipo de financiamento de mais logo prazo.
E como estes consumidores, assustados, pararam de comprar, as vendas caíram. E como as vendas caíram…
Na área dos caminhões outro fator, bem concreto, acentuou a rampa rumo ao inferno: na medida em que a economia foi esfriando as cargas diminuíram e a frota já existente nas transportadoras passou a ficar até ociosa.
Felizmente, muito em decorrência dos novos players que foram atraídos por aquele mercado de quase 4 milhões de unidades anuais e se instaram no País, os lançamentos de novos produtos continuam sendo realizados. Tanto de automóveis quanto de comerciais leves, caminhões e ônibus.
É toda uma nova geração de veículos que está passando a ser oferecida aos consumidores com inegáveis avanços tecnológicos diante dos anteriores, sobretudo na área de motorização, design e conectividade.
Em época normais este tipo de lançamento costuma gerar desejo de compra, o primeiro passo para a movimentação do mercado. No quadro econômico atual, todavia, com o desemprego alcançando calculadas 11 milhões de pessoas, projeção de um PIB novamente negativo e de um quadro político entravado, por maior que seja o desejo de compra o medo do futuro permanece dando as cartas.
Mas o desejo de compra, de qualquer forma, continua sendo gerado e aguçado com tantos novos lançamentos. Desejo que permanece sendo o primeiro passo, pronto para ser dado pelo consumidor na hora em que a poeira baixar e o Brasil voltar minimamente ao normal. E esta poeira, com certeza, vai baixar. É só uma questão de tempo. Talvez até de pouco tempo.