Desafiador, imprevisível, turbulento, inimaginável, instável e, além de tantos outros adjetivos capazes de definir 2016, para muita gente um ano para esquecer. Ao olhar por uma perspectiva histórica o período foi marcado por um aprofundamento de uma crise que já se arrastava desde 2015. A polarização política nas ruas, os desencontros em Brasília, DF, o déficit nas contas públicas e os poderoso acabando atrás das grades acrescentou mais tempero em uma sopa de desconfiança que o brasileiro já vinha experimentando desde o fim de 2014. Em especial ao setor automotivo, o caldo se tornou ainda mais indigesto.
O ano começou com o balanço de 2015 apresentando previsões nada animadoras sobre um resultado bem abaixo do desejado. Depois de sete anos consecutivos, produção e vendas registraram volumes inferiores ao patamar de 3 milhões de unidades, para 2,43 milhões e 2,56 milhões, respectivamente, baixas de 22,3% e 26,6% em relação ao ano anterior. Na ocasião, o otimismo do então presidente da Anfavea, Luiz Moan, nas projeções para 2016, não passava de mais quedas, de 7,5% no ritmo das fábricas e de 8,1% no mercado interno.
O desempenho do setor ao longo dos meses, no entanto, foi delineando cenário ainda mais tempestuoso, embora alguns momentos, especialmente no segundo semestre os representantes da indústria tenham tateado o fundo do poço com a indicação de estabilidade. A verdade, porém, é que o mercado começou o ano anotando baixa de quase 40% e chega ao fim do ano registrando em torno de 20%, enquanto a produção acusava queda perto de 30% e chegou em novembro com recuo por volta de 14%.
Pelas previsões da Anfavea, revistas em meados do ano por Antonio Megale, eleito o presidente da Anfavea em abril para o próximo triênio, a estimativa é de fechar o ano com produção de 2,2 milhões de unidades, volume 5,5% inferior a 2015, e vendas pouco acima de 2 milhões de veículos, queda de 19%. Até o início de novembro Megale ainda apostava nestas projeções, no mínimo, “bem próximas delas”.
O resultado positivo do ano certamente vem das exportações, que deve fechar o ano com embarques de mais de meio milhão de unidades, o que deverá acusar um crescimento superior a 20% na comparação com 2015. Cabe lembrar, porém, que embora as remessas tenham contribuído para minimizar efeitos mais dramáticos no chão de fábrica, o ano foi marcado por desentendimento entre fornecedores e montadoras que, alguns momentos do ano, obrigaram interrupções na produção, especialmente na Volkswagen, que chegou a ficar parada por pelo menos dois meses.
Não deixa dúvida, no entanto, que o maior retrato da crise apresentado nos resultados do setor ao longo do ano foi o desempenho do segmento de pesados, essencialmente atrelado ao ambiente econômico e político pelo qual passa o País. Ao longo do ano, os volumes de venda mensais de caminhões oscilaram entre 3,5 mil a 4,5 mil unidades, um fiasco para segmento que chegou a ter pico de vendas superior a 150 mil unidades/ano. Em 2016, as fabricantes de caminhões tiveram de conviver com uma capacidade ociosa acima de 70% e, enquanto, a recuperação econômica não mostrar o ar de sua graça, nada índica que a situação melhore. Aliás, seus representantes até apostam em crescimento nas vendas de dois dígitos em 2017, por volta de 60 mil unidades, patamar do início dos anos 2000.
A turbulência do ano certamente fez mais vítimas. O saldo de empregos no setor, por exemplo. Em janeiro as montadoras acolhiam 129,6 mil trabalhadores e chegou a novembro com quadro de 123,3 mil empregados, 6,2% a menos do que o mesmo mês de 2015. Obrigou também mudanças rotas, como a decisão da Honda de adiar a inauguração de sua fábrica em Itirapina, SP, ou até mesmo de medidas mais drásticas, casos do pedido de recuperação judicial da Arteb, da interrupção da produção da unidade de Guarulhos, SP, da Randon, ou a parada na produção da Chery por seis meses em Jacareí, SP.
O setor, porém, também não ficou parado. Afinal, ficou claro no Seminário de Compras do AutoData, realizado em março, o investimento não cessa. E nem pode. 2016 também foi ano de inaugurações. A Jaguar Land Rover iniciou produção dos seus utilitários esportivos de luxo em Itatiaia, RS, a Mercedes-Benz abriu as portas de Iracemápolis, SP, com a montagem dos Classe C e do GLA e a Toyota começou a produzir os motores para o Etios em, Porto Feliz, SP. A Toyota, aliás, é a protagonista de uma das boas notícias do ano ao anunciar R$ 600 milhões para expansão da mesma fábrica do Interior paulista, onde planeja instalar linha de montagem para construir o motor do Corolla.
Além de novas fábricas e outras tantas bem recentes no parque industrial brasileiro que surgiram em 2016, o ano também se mostrou fértil para os lançamentos de produtos, nos quais alguns se apresentam como candidatos a se destacarem nos anos por vir. Apenas para listar os mais significativos, a FCA introduziu três modelos inteiramente novos, o compacto Mobi, a picape Toro – primeiro produto da marca Toro a ser produzido fora de Betim, MG – e o Jeep Compass. A Ford inovou ao introduzir motor 1.0 turbo no Fiesta. A Honda começou a oferecer a décima geração do Civic. A Nissan fez barulho com o Kicks. A General Motors lançou o novo Cruze e as francesas das PSA incorporaram novos motores de 3 cilindros com remodelação geral na linha dos Peugeot e Citroën.
É no segmento de SUVs, no entanto, que muito se disse em 2016 e ainda continuará a falar. As montadoras investiram na categoria nos últimos tempos. O Salão do Automóvel de São Paulo, ocorrido em novembro, aliás, em nova casa depois de quarenta anos de Anhembi – mudou-se para o São Paulo Expo – não deixou dúvidas. Foi a mostra dos SUVs, das marcas de luxo às mais populares, todas tinham uma ferramenta para tentar beliscar uma fatia do segmento. Casos do Hyundai Creta, do New Tucson, do Renault Captur, do Chery Tiggo, do Peugeot 3008 e dos já citados Jeep Compass e Nissan Kicks. Apenas alguns dos exemplos que estarão em campo.
Para encerrar o ano ainda, apesar das propaladas e até já enfadonhas notícias ruins, a Volkswagen Truck e Bus divulgou, em novembro, investimento de R$ 1,5 bilhão, o maior anúncio do ano e da história da empresa no País. A grana tem como principal destino a sustentação de seus planos de internacionalização, além de melhorias nos processos produtivos de Resende, RJ.
O ano de 2016 foi certamente um ano difícil ou pelo menos em partes, por assim dizer, diante do saldo positivo apresentado por novas fábricas e lançamentos. Para muitos dos representantes da indústria automotiva, que ele não deixe saudades em 2017.